Cliente fim-de-semana

Já há muito tempo que trabalho em part-time como repositor de hipermercado aos fins de semana e ao longo desses anos inúmeras foram as constatações que fiz.

Uma dessas prende-se ao facto de não perceber o fascínio que os chamados clientes de fim-de-semana têm em levantar o rabinho da cama bem cedinho para fazer fila nas entradas dos hipermercados. Quando chove então, naqueles dias em que o bom mesmo é ficar no quentinho da cama, lá estão eles sempre prontos a acelerar desenfreadamente só para ver quem é o primeiro a entrar. No entanto são estas mesmas pessoas que passam a semana inteira a reclamar que têm que se levantar cedo para ir trabalhar. Ora bem, levantar pra trabalhar não, mas para fazer comprinhas já pode ser... Ele há doidos para tudo.

Outro aspecto que levanta uma questão pertinente é o porquê de estas pessoas arrastarem atrás de si a família inteira. Aquilo mais parecem excursões. Vem o pai com o seu fato de treino roxo e amarelo fluorescente, a mãe, os filhos aos gritos, a tia, o avô, a prima grávida, a vizinha... Só falta mesmo vir o cão e o gato.

Mal passam a entrada surge então uma dúvida quase que existencial: O que é que vieram cá fazer? As pessoas parecem perdidas num mundo fantástico de cores e preços baixos.

Promoção... Essa é a palavra de ordem. O cliente típico português adora tudo o que é promoção. Chega mesmo a comprar aquilo que nunca irá usar na vida, mas que segundo eles vale a pena porque está em promoção.

E quando as crianças resolvem fazer do corredor uma pista de corridas e aceleram furiosamente com os carros só parando quando embatem nas pernas do pobre repositor. É aqui que normalmente solto um tímido e simpático FODA-SE. E já agora quem terá sido o anormal que decidiu colocar um ferro no carrinho mesmo à altura do tornozelo? Logo onde dói mais.

Outra coisa que detesto são aquelas perguntas estúpidas: "Você trabalha aqui?" Ora bem, estou de bata branca e um cartão que me identifica e não sou enfermeiro. Estou a repor produtos nas prateleiras, será que trabalho aqui ou vim só ver a paisagem?

Ou então aquela dúvida: "Esta promoção "Leve 2 pague 1" como é que funciona?" Confesso que me é muito dificil explicar o que é que "Leve 2 pague 1" quer dizer, é que é mesmo complicado... Entre os funcionários tinhamos uma graçola preparada para estas situações em que diziamos que se levasse 4 só pagava 2, se levasse 6 só pagava 3, mas isso parecia ser pior porque baralhava mais ainda as pessoas. Haja paciência...

A meio da actividade de lazer vulgo "compras" eis que surge outra questão: "Onde colocar as embalagens do leite ou a caixa de garrafas de vinho?" Não se pode esmagar as alfaces ou os tomates maduros. Toca então a tirar tudo para fora para voltar a colocar no carrinho. Não era mais fácil tê-lo feito primeiro ou ir guardando espaço para os artigos mais pesados? Fica aqui a sugestão...

Pois bem, carrinho cheio é hora de ir pagar. Outro dilema surge então pelo caminho: "A que caixa ir?" É preciso escolher uma que tenha pouca gente. É vê-los então de um lado para o outro à procura da caixa mágica, quando seria mais rápido simplesmente escolher uma e esperar a vez.

Escolhida a caixa toca a colocar os produtos na passadeira rolante, mas indo sempre espreitando as últimas das revistas cor-de-rosa ou então a correr para ir buscar aquilo que não podia faltar na lista de compras mas que as pessoas se esquecem sempre.

Na altura de pagar eis que toca o telemóvel. O mais correcto seria ignorar o toque real da última música do Tony Carreira e pagar o mais rápido possivel pois estão outras pessoas à espera.

Mas não... A chamada é urgentíssima:

"Tou!! Tone!! Tou no Feira Nova, tem aqui um vinho em promoção, mas não vou levar porque não percebi muito bem como é que funcionava a promoção que dizia: "Leve 2, pague 1..."